"Os espelhos estão cheios de gente.
Os invisíveis nos vêem.
Os esquecidos se lembram de nós.
Quando nos vemos, os vemos.
Quando nos vamos, se vão?"
Eduardo Galeano: Espelhos

sábado, 20 de maio de 2017

Do Império Celta ao Império Assírio IX

O cartaginês Hanão foi, com sessenta navios, até a Guiné, à ilha Fernando Pó, depois de haver contemplado as eurpções vulcânicas do Camerum. Sobre o Atlântico, as trocas entre celtas e cartagineses se intensificavam. As cidades da Jônia enxamearam. Mégara fundou Bizâncio e controla no Mar Negro a importação de trigo. Mileto cria Cízico no Helesponto e regulariza o tráfico com os citas.

Há ali todo um mundo que as cobiças sanguinárias do imperador assírio não atingem. Quando muito ouve ele contar as riquezas pelos mercadores da Lídia que formam na Ásia Menor, na encruzilahada das rotas, entre a Jônia, o Egito e o Eufrates, um ativo Estado comercial.

Assurbanípal entrou em relações com o rei da Lídia, Giges, capitão audacioso que soube fazer de seu país a artéria principal do tráfico de Nínive e Éfeso, por Sardes, sua capital. A Lídia possuía as mais ricas jazidas de ouro, pelo que se tornou um importante centro econômico. Apoiava-se na atividade marítima da Jônia e suas relações com Mileto lhe abriam o mercado egípcio. O Rei Giges enviava colonos ao Mar do Norte e presentes ao Apolo de Delfos: jactava-se de agir e pensar como grego.

Candaules, rei da Lídia, mostra sua esposa escondendo de Giges um dos seus ministros, enquanto vai para a cama. 
William Etty

Foi sob seu reinado que a moeda apareceu em Sardes - estáteres de ouro e de prata - cujo manuseio facilitou singularmente os pagamentos e acelerou as transações. A inovação contribuiu para a prosperidade da Lídia.

Se a posição desse Estado era vantajosa para sua economia, suas vizinhanças imediatas o eram menos. Suas fronteiras estavam à mercê das incursões bárbaras e os bandidos da Capadócia espreitavam as ocasiões que para tal se oferecessem. Giges se aliaria de bom grado à Assíria para resistir a eles. Negociou: a aliança com os assírios assegurou-lhe ao mesmo tempo a saída no Eufrates.

Essa política entretanto não salvou a Lídia: os bárbaros a invadiram pelo Bósforo. Assurbanípal não interveio, pois nesse meio tempo Giges pensara dever tratar com o Egito e formar com ele uma liga dirigida contra a Assíria. Devido a tal erro diplomático, os sucessores de Giges levaram anos para recobrar sua prosperidade.

Assurbanípal mantinha pois a supremacia no Oriente.

Não obstante, semelhante poderio, baseado unicamente na violência, não podia pretender durar. A revolta era alentada em todo o império, inclusive entre os árabes, cujo rei acabava de ser arrastado a Nínive, preso pela mandíbula a uma corrente de cão. Antes de morrer, Assurbanípal calculou sem dúvida o que seria a vingança dos povos: pelo planalto do Irã ela se levantava.

RIBARD, André. A prodigiosa história da humanidade. Rio de Janeiro: Zahra Editores, 1964. V. 1. p. 82-4.

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