"Os espelhos estão cheios de gente.
Os invisíveis nos vêem.
Os esquecidos se lembram de nós.
Quando nos vemos, os vemos.
Quando nos vamos, se vão?"
Eduardo Galeano: Espelhos

domingo, 6 de março de 2016

Origem dos antigos egípcios

Três jovens instrumentistas. Pintura mural, XVIIIª dinastia, c. 1400 a.C.

[...] a despeito das discrepâncias que apresentam, o seu grau de convergência prova que a base da população egípcia no período dinástico era negra. Assim, todas elas são incompatíveis com a teoria de que o elemento negro se infiltrou no Egito em período tardio. Pelo contrário, os fatos provam que o elemento negro era preponderante do princípio ao fim da história egípcia, particularmente se observarmos, uma vez mais, que 'mediterrânico' não é sinônimo de 'branco'. [...] as representações dos homens do período proto-histórico, o mesmo do período dinástico, são absolutamente incompatíveis com a ideia de raça egípcia difundida entre os antropólogos ocidentais. Onde quer que o tipo racial autóctone esteja representado com alguma clareza, ele é nitidamente negroide. Em parte alguma elementos indo-europeus ou semitas são representados como homens livres, nem mesmo como cidadãos comuns a serviço de um chefe local. Eles aparecem como estrangeiros submetidos [...]. A melanina, substância química responsável pela pigmentação da pele, é, geralmente, insolúvel e preserva-se por milhões de anos na pele dos animais fósseis. Portanto há razões de sobra para que seja facilmente encontrada na pele das múmias egípcias, apesar da lenda persistente segundo a qual a pele das múmias, tingida pelo material de embalsamamento, já não é suscetível de qualquer análise [...]. De qualquer forma, queremos simplesmente afirmar que a avaliação do nível de melanina através dos exames de microscópio é um método de laboratório que nos permite classificar os antigos egípcios inquestionavelmente entre as raças negras. [...]

Para os escritores gregos e latinos contemporâneos dos antigos egípcios, a classificação física desses últimos não colocava problemas: os egípcios eram negros, de lábios grossos, cabelo crespo e pernas finas. [...]

Não é perda de tempo conhecer o ponto de vista dos principais envolvidos. Como os antigos egípcios viam a si mesmos? Em que categoria étnica se colocavam? Como se denominavam a si mesmos? A língua e a literatura que os egípcios da época faraônica nos deixaram fornecem respostas explícitas a essas questões, que os acadêmicos insistem em subestimar, distorcer e 'interpretar'.

Os egípcios tinham apenas um termo para designar a si mesmos: kmt = 'os negros' (literalmente). Esse é o termo mais forte existente na língua faraônica para indicar a cor preta; assim, é escrito com um hieróglifo representando um pedaço de madeira com a ponta carbonizada [...]. Finalmente, preto ou negro é o epíteto divino invariavelmente utilizado para designar os principais deuses benfeitores do Egito, enquanto os espíritos malévolos, são qualificados como desrêt = vermelho. Sabemos que, entre os africanos, esse termo se aplica às nações brancas [...].

De maneira geral, toda a tradição semítica (judaica e árabe) classifica o antigo Egito entre os países dos negros. A importância desses depoimentos não pode ser ignorada, porque os judeus eram povos que viviam lado a lado com os antigos egípcios e, algumas vezes, em simbiose com estes, e nada tinham a ganhar apresentando uma falsa imagem étnica dos mesmos. [...]

DIOP, Cheikh Anta. "Origem dos antigos egípcios". In: MOKHTAR, G. (Coord.). História Geral da África. A África Antiga. São Paulo: Ática/UNESCO, 1983. p. 39-70.

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