"Os espelhos estão cheios de gente.
Os invisíveis nos vêem.
Os esquecidos se lembram de nós.
Quando nos vemos, os vemos.
Quando nos vamos, se vão?"
Eduardo Galeano: Espelhos

domingo, 4 de outubro de 2015

O mundo bárbaro: os costumes

Breviário de Alarico, compilação de leis romanas do reino de Tolosa sob Alarico II (487-507 d.C.). Manuscrito latino, 803-814. Artista desconhecido

Em sua longa existência, o Estado Romano entrou em contato com os mais diversos povos. Muitos desses povos foram vencidos e passaram a fazer parte do Mundo Romano. Outros, no entanto, continuaram fora das fronteiras do Império Romano. Partindo da ideia de que Roma era sinônimo de Civilização, os romanos consideravam bárbaros todos os povos que deles viviam distantemente e falavam outras línguas que não o latim.

Dentre os povos julgados bárbaros pelos romanos sobressaíram os germanos, que, ao penetrarem em massa no Império Romano, contribuíram decisivamente para a formação da sociedade europeia. [...]

[...] Começavam novos tempos, porque a sociedade, resultante da interpenetração de romanos e germanos, evoluiu lentamente ao sentido do feudalismo. E essa transição do escravismo ao feudalismo processou-se do século V ao século X,

A origem dos germanos é discutida. No século III, viviam em terras situadas entre o Rio Reno, os Mares do Norte e Báltico, os Rios Danúbio e Vístula e os Montes Cárpatos: a chamada Germânia.

Seus costumes eram simples. Viviam em aldeias, sendo a caça importante atividade econômica. [...] Praticavam a agricultura, a criação de gado e a pilhagem, como atividade econômica complementar. Desconheciam a escrita, e o comércio era feito à base de trocas, embora muitos germanos, localizados próximos às fronteiras do Império Romano começassem a utilizar moedas. Seu artesanato era rudimentar.

A união de várias aldeias formava uma tribo. As tribos agrupavam-se em povos, como os visigodos, os ostrogodos, os alanos, os vândalos, os alamanos, os suevos, os saxões, os anglos, os jutos, os francos etc.

Em épocas recuadas, sua principal instituição política era a Assembleia dos Guerreiros, que, uma vez por ano, decidia da necessidade, ou não, de empreender uma expedição de guerra. Geralmente, elegia um chefe guerreiro, o chamado Koenig, que os romanos chamaram Rei. A continuidade das guerras permitiu que se consolidasse a autoridade dos Chefes Guerreiros ou Reis.

Sua religião era politeísta: adoravam inúmeros deuses, os quais se identificavam com as forças da Natureza. Odin ou Wotan era o senhor do Céu e deus da guerra e do fogo; Thor, o deus do trovão; Mon, a deusa Lua; Sunna, a deusa do Sol; Fréia, a deusa da primavera e do amor.

"Nas modernas línguas germânicas, o alemão e o inglês, os nomes de alguns dias originam-se dos nomes daquelas antigas divindades. Assim, domingo, em alemão, é Sunntag, e Sunday, em inglês, palavras que significam dia do Sol (Sunna); segunda-feira é Montag, em alemão, e Monday, em inglês, dia da Lua (Mon); sexta-feira é Freitag, em alemão, e Friday, em inglês, dia de Fréia."

Acreditavam os germanos que os deuses moravam no Valhala, para onde iriam os guerreiros valentes, mortos em combate. Para lá seriam conduzidos pelas Valquírias, deusas guerreiras que montavam cavalos alados.

A propósito, veja o depoimento de Amiano Marcelino (320-390), historiador romano, a respeito dos alanos:

"Os alanos são geralmente belos e garbosos. Seus cabelos puxam para louro; o olhar é antes marcial que selvagem. Na rapidez do ataque, nada ficavam devendo aos hunos [...] O gozo que os espíritos mansos e pacíficos encontram em um lazer espiritual, eles colocam nos perigos e na guerra. A seus olhos, o supremo bem é perder a vida em um campo de batalha. Morrer de velhice ou por um acidente é um opróbrio [vergonha], que eles cobrem de horríveis ultrajes. Matar um homem é um heroísmo para o qual não medem os elogios. O mais glorioso troféu é a cabeleira do inimigo escalpado. Serve de enfeite para o cavalo de guerra. Não se vê junto a eles nem templos nem santuário nem mesmo nicho coberto de palha. Uma espada nua, fincada na terra, segundo o rito bárbaro, torna-se o emblema de Marte. Honram-na devotadamente como a soberana das regiões que percorrem."

Não lhe parece que aquele autor romano se mostra claramente impressionado pelo culto da força e pelo caráter guerreiro dos alanos?

Também as palavras do historiador Tácito (54-130), no seu livro Costumes dos Germanos, revelam como o espírito guerreiro dos germanos impressionava a sociedade romana. Veja, a seguir, como a descrição dos vândalos apresenta este povo como verdadeiros cavaleiros da Morte:

"[...] São selvagens e aumentam sua selvageria natural, emprestando os socorros da arte e do momento. Seus escudos são negros, seus corpos, cobertos de pintura. Para combater, escolhem noites escuras. Só pelo horror e a sombra, que encobrem este exército fúnebre, levam o terror ao inimigo. Ninguém poderia suportar a visita estranha e como que infernal. Pois, em toda a batalha, os olhos são os primeiros vencidos."

Alguns desses povos se haviam convertido ao Arianismo, heresia do Cristianismo [...]. Seria mais um ponto de atrito com as populações que viviam dentro das fronteiras do Império Romano, que desmoronou diante das invasões dos séculos IV e V.

AQUINO, Rubim Santos Leão de. [et alli]. Fazendo a História: da Pré-História ao Mundo Feudal. Rio de Janeiro: Ao Livro Técnico, 1989. p. 110-11.

Nenhum comentário:

Postar um comentário