"Os espelhos estão cheios de gente.
Os invisíveis nos vêem.
Os esquecidos se lembram de nós.
Quando nos vemos, os vemos.
Quando nos vamos, se vão?"
Eduardo Galeano: Espelhos

quarta-feira, 2 de novembro de 2011

Cemitérios: tristes, sinistros e amedrontadores

Decoração da tumba do escriba Menna, Luxor (Tebas, Egito)

Tristes, sinistros e amedrontadores. Cemitérios não são os lugares mais confortáveis do mundo. Mas, acredite, a vida era pior sem eles. É que antes de alguém ter essa sacada - a de que os mortos deveriam ser enterrados em covas separadas, que ficassem em um terreno específico para esse fim -, o costume no Brasil era enterrar os corpos dentro das igrejas. Na maior parte das vezes, não havia caixões e ninguém se preocupava com a profundidade da cova ou com a marcação do local. Ou seja, debaixo dos pés de todo mundo que ia à missa, repousavam esqueletos e corpos apodrecendo. Não é difícil imaginar a quantidade de doenças que a prática ocasionava.

Foi só na metade do século XIX que as coisas começaram a mudar por aqui. Em 1850, a Câmara de São Paulo decidiu construir um cemitério municipal, que foi inaugurado oito anos depois: o cemitério da Consolação. Lá estão enterrados vários de nossos presidentes e personalidades brasileiras importantes, como o escritor Monteiro Lobato.

Na Europa, já havia locais próprios para enterrar os defuntos desde o século XVI. O destino do morto dependia, claro, de sua posição social (algo que não mudou tanto assim, já que terrenos em cemitérios podem custar vários milhares de reais). Nessa época, o cemitério dos ricos ficava próximo das igrejas. O dos pobres era uma vala onde os corpos eram jogados sem qualquer identificação e que ficava bem afastada da casa de Deus. Quem não tinha dinheiro para bancar o enterro, mas também não queria deixar o parente ir parar na vala comum, acabava guardando o corpo dentro de casa. Jornais londrinos de 1830 volta e meia davam notícia de famílias que deixaram o corpo do filho apodrecendo no quarto.

Os egípcios, há cinco mil anos, também tinham rituais diferentes para nobreza e plebe. Falecidos do povão eram colocados em um buraco no chão e cobertos com um manto de fibra natural, que impedia a proliferação de doenças. Já os faraós, eram mumificados e enterrados em pirâmides, com direito a grandes cerimônias cheias de pompas.

A comemoração fúnebre não tinha o objetivo de honrar o falecido, como acontece hoje, mas de garantir que ele entrasse no paraíso. Os egípcios acreditavam que de lá ele poderia abençoar seus súditos, principalmente aqueles que se esforçaram para que ele fosse devidamente bem recebido no mundo dos mortos. Uma crença da época dizia que o defunto que não gostasse da festa de enterro se vingaria, mantendo-se entre os vivos.

Na Índia, o costume era queimar os mortos. A viúva do defunto acabava indo para a fogueira também - voluntária ou involuntariamente. Esse costume hindu (o hinduísmo é a religião majoritária no país) é chamado de sati e acontecia porque o status de viúva era visto como impuro e vergonhoso. Ele só foi banido em 1829, mas há registros de que continuou acontecendo na Índia até 1956. Já os celtas, que também gostavam do churrasquinho do morto, eram menos radicais. Eles incineravam os corpos em fornos, guardavam o pó em urnas e não metiam a viúva no meio.

SOALHEIRO, Bárbara. Como fazíamos sem... São Paulo: Panda Books, 2006. p. 116-119.

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